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Sintomas e diagnósticos de endometriose: o que observar e quais as melhores técnicas

Exames modernos prometem diagnósticos mais precisos e menos invasivos ou tardios na detecção da endometriose, doença que afeta cerca de 10% de pessoas com útero e em idade fértil.

Antes mesmo do início da minha vida sexual, recebi a indicação de um ginecologista para tomar anticoncepcionais. Meus ciclos menstruais eram irregulares, minhas cólicas eram agudas e tudo indicava que eu sofria da síndrome dos ovários policísticos (SOP).

Durante 13 anos, experimentei contraceptivos hormonais de quase todos os tipos: pílulas de diferentes fórmulas, anel vaginal, adesivo anticoncepcional e, de fato, as dores e oscilações de sangramento praticamente desapareceram. Nesse meio tempo, tentei parar de fumar por diversas vezes -- já que tabagismo e contraceptivos hormonais são uma combinação de risco para mulheres. (1)

Nunca consegui deixar de fumar por períodos longos, o último anticoncepcional que provei passou a me provocar cefaleias e, finalmente, optei por deixar de tomar contraceptivo hormonal há três anos.

O resultado é que voltei a lidar com cólicas menstruais longas e incapacitantes. Sei que uma mulher pode sofrer desmaios, vômitos, confusão, diarreia ou perda de sensibilidade nas pernas graças à endometriose porque já experimentei os sintomas infinitas vezes. O que eu não tinha até este ano era a confirmação médica de que meus incômodos eram provocados por endometriose.

O diagnóstico da doença surgiu de modo “acidental”, recentemente, durante exames físicos para a colocação de um DIU --  embora eu tenha perguntado a meus médicos todos, desde a adolescência, se não era o caso de investigar uma provável endometriose no meu corpo. A resposta dos ginecologistas todos variava pouco entre afirmações como “a menstruação dolorosa é normal na vida de muitas mulheres” e “mesmo que seja endometriose, o anticoncepcional pode te livrar dos sintomas. Vamos direto a ele”.

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Para entender melhor todos os desencontros que podem haver entre ginecologista e paciente na investigação de endometriose, conversei com um dos médicos responsáveis pelo desenvolvimento de uma técnica que se tornou referência mundial na detecção da doença. Ao que tudo indica, o diagnóstico de endometriose já não precisa ser tão tardio e nem tão invasivo (como acontece com pacientes que passam por laparoscopia para investigar as lesões).

O Dr. Manoel Orlando da Costa Gonçalves, especialista em radiologia e ultrassonografia pelo Colégio Brasileiro de Radiologia—referência nacional nesta área médica—trouxe novas perspectivas para a detecção da endometriose.

Abaixo ele responde a 5 perguntas frequentes sobre esta condição, trazendo orientações úteis para pacientes que ainda não têm certeza sobre como buscar um diagnóstico eficaz ou o tratamento mais adequado para o seu caso.

O exame de ultrassonografia com preparo intestinal tem se mostrado muito eficiente e menos invasivo no diagnóstico da endometriose—por que a detecção da doença é tão difícil?

A suspeita de endometriose pode ser feita por dados clínicos ou exame físico realizado pelos ginecologistas. No mundo inteiro, uma parte desses profissionais subestimam as queixas de pacientes (como dor importante nos períodos pré e menstrual, dor na relação sexual ou infertilidade). Isso é o que retarda a investigação e diagnóstico. Há estudos que mostram que o diagnóstico da endometriose pode demorar mais de 7 anos desde o início das queixas da paciente.

Para o diagnóstico mais preciso, os exames de imagem são fundamentais, principalmente ressonância magnética e ultrassonografia com preparo intestinal. Para que sejam eficientes, é necessário que os exames sejam feitos em serviços especializados -- e que experts em endometriose façam os relatórios.

A ultrassonografia com preparo intestinal leva vantagem sobre outros métodos de detecção da doença porque pode identificar lesões menores, principalmente no intestino e bexiga (2). Antes desses novos protocolos por imagem serem desenvolvidos, era muito comum realizar uma videolaparoscopia (cirurgia com pequenos furos no abdome) para fazer o diagnóstico. Em todo o mundo ainda há poucos centros avançados no diagnóstico por imagem da endometriose e o Brasil é um dos países com maior número de especialistas nessa área.

Mesmo com queixas de dores incapacitantes para menstruar nos últimos dez anos, todos especialistas me aconselharam o anticoncepcional ao invés de investigar a endometriose. Por que se adota tanto esse procedimento?

Em primeiro lugar, é importante frisar que os anticoncepcionais orais ou o dispositivo intrauterino medicado (Mirena) não tratam a endometriose, mas na maioria das vezes diminuem ou eliminam os sintomas. Sempre que há a suspeita clínica, deve-se fazer a investigação especializada por imagem, porque é a melhor forma não invasiva de estadiar a doença.

Nem sempre a intensidade dos sintomas têm relação com a gravidade da doença -- e mesmo um exame ginecológico bem realizado também tem limitações em avaliar a extensão da endometriose. É muito importante mapear a endometriose, porque além dos sintomas que pode causar, em alguns casos ela pode afetar de forma grave o funcionamento de órgãos importantes, como os rins e o intestino*.

Nem todos os médicos indicam adequadamente a investigação devido à falta de informação ou pela ausência de serviços especializados de imagem na região onde atuam. O custo dos exames também pode ser um fator limitante, porque nem sempre os convênios credenciam ou reembolsam esses procedimentos.

*[Nota da Revisora Científica: esta situação é extremamente rara.]

Uma vez diagnosticada a endometriose, quais são as alternativas mais eficientes para tratá-la?

O tratamento realmente eficiente é a cirurgia com a retirada completa dos focos*. Para que a execução desse procedimento seja adequada é necessário o estadiamento pré-operatório por imagem e a cirurgia tem de ser realizada por uma equipe especializada.

Deve-se ter em mente que nem todas as pessoas com endometriose têm indicação cirúrgica: isso vai depender do estadiamento da doença, sintomas, idade e desejo reprodutivo. Quando não há indicação cirúrgica, o controle clínico mais eficiente se faz com o uso de medicamentos via oral, dispositivos intrauterinos (DIUs) ou implantes subcutâneos que contenham progesterona. Outras ações que também podem ajudar no controle dos sintomas são as que melhoram o bem estar e reduzem o estresse, principalmente atividade física aeróbica.

*[Nota da Revisora Científica: apesar de efetivo, esse tratamento não pode ser considerado totalmente definitivo. Há relatos de recorrência de 10% a até 76% nos cinco anos seguintes ao procedimento.]

É verdade ou mito que uma gravidez pode curar a endometriose?

A idéia de que a gravidez trata a endometriose é um MITO. Os exames de imagem que realizamos em pacientes com endometriose antes e depois da gravidez mostram que a doença continua presente (3). A gravidez acaba em geral tendo efeito semelhante aos bloqueios hormonais, inibindo os sintomas e o seu crescimento.

Há várias teorias sobre o porquê do aparecimento da endometriose. A mais conhecida é a que atribui a doença ao extravasamento de sangue, com endométrio, para dentro do abdome no período menstrual. Hoje sabemos que esse fenômeno ocorre praticamente em todas as mulheres. Então, porque só uns 10 a 15% tem a doença? Provavelmente por fatores genéticos ou hereditários: filhas, irmãs ou parentes próximas de pacientes com endometriose têm maior probabilidade de desenvolver a doença.

O que todas as pacientes com endometriose deveriam saber?

Que dor intensa no período menstrual ou na relação sexual não é normal, deve ser investigada; que é necessário consultar médicos especializados para o diagnóstico e tratamento; que o exame não invasivo mais eficiente para o diagnóstico é a ultrassonografia especializada com preparo intestinal (4), mas a ressonância magnética, com protocolo específico, também tem alta acurácia nesse diagnóstico (5); que nem sempre pacientes com endometriose são inférteis. Muitas engravidam espontaneamente, com cirurgia ou com tratamentos de fertilização assistida.

Por último, é importante lembrar que, em cada paciente, a endometriose tem características próprias e sempre há formas clínicas ou cirúrgicas de controlar a doença e os sintomas.

A boa notícia é que a endometriose não precisa ser um beco sem saída. Avanços científicos têm facilitado a vida de quem tem acesso ao exame especializado. Agora, é batalhar pelo direito de mais pessoas a diagnósticos melhores e mais rápidos da doença.

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