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A poluição do ar pode afetar a menstruação? Uma nova pesquisa diz que sim.

Quando a gente pensa nos efeitos da poluição do ar, geralmente imaginamos um céu cheio de fumaça e talvez alguma tosse. Mas uma nova pesquisa sugere que ela também pode estar afetando algo muito mais pessoal: o seu ciclo menstrual.
Em um estudo inédito, nossa equipe de pesquisa do Senseable City Lab do MIT (EUA) e da Universidade do Colorado em Denver (EUA), em parceria com o Clue, analisou como a exposição à poluição do ar afeta a saúde menstrual.
Analisamos mais de 2,2 milhões de ciclos menstruais acompanhados por 92.000 pessoas que usam o Clue em 230 cidades nos Estados Unidos, no Brasil e no México. Nossas descobertas, publicadas na revista The Lancet Planetary Health, trazem novas evidências de que o ambiente em que vivemos pode moldar nossa saúde reprodutiva e que os ciclos menstruais merecem mais atenção nas pesquisas de saúde pública.
Poluição do ar e saúde
A poluição do ar é um dos maiores riscos à saúde ambiental em todo o mundo. A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que ela cause mais de 4 milhões de mortes prematuras todos os anos (1). A maioria das pesquisas até agora se concentrou em como o ar poluído afeta os pulmões e o coração, ligando-o a condições como asma, doenças respiratórias crônicas, derrames e ataques cardíacos (2).
Nos últimos anos, os cientistas começaram a explorar também os efeitos da poluição do ar na saúde reprodutiva, particularmente na fertilidade e na gravidez. Estudos relacionaram a poluição do ar à infertilidade, ao parto prematuro e ao baixo peso ao nascer (2).
Mas o ciclo menstrual, um indicador-chave da saúde reprodutiva e geral, tem sido amplamente ignorado nessa discussão.
O que é PM2.5 e por que devemos nos preocupar?
Nosso estudo se concentrou em um tipo de poluente atmosférico chamado PM2.5. Isso significa partículas finas com 2,5 mícrons ou menos (cerca de 30 vezes menores que um fio de cabelo humano). Essas partículas minúsculas vêm de fontes como escapamentos de carros, usinas de energia e fábricas (1). Por serem tão pequenas, elas podem penetrar profundamente nos pulmões, entrar na corrente sanguínea e causar inflamação no corpo (2). Existem muitos tipos de poluentes atmosféricos, mas o PM2.5 é o que tem maior relação com problemas de saúde (1).
Queríamos descobrir se a exposição a esse tipo de poluição ao longo do tempo poderia afetar os ciclos menstruais, algo que ainda não havia sido estudado em grande escala.
O que descobrimos
Analisamos dois tipos de exposição à poluição:
Exposição de curto prazo: níveis de poluição durante um único ciclo
Exposição de longo prazo: níveis médios de poluição na cidade durante vários ciclos monitorados
Descobrimos que pessoas que moram em cidades com maior exposição de longo prazo ao PM2.5 eram mais propensas a ter ciclos atípicos, especialmente os mais longos. Isso pode indicar mudanças no sistema endócrino, que controla os hormônios, incluindo os que regulam a menstruação.
A exposição de curto prazo não teve um impacto significativo nesse mesmo ciclo, mas vimos sinais de que a exposição à poluição do ar durante os ciclos anteriores ainda pode ter um papel importante, sugerindo que as exposições ambientais podem afetar o ciclo com algum atraso.
Por que essa pesquisa é importante
Os ciclos menstruais são mais do que apenas um evento mensal—eles são um reflexo da sua saúde e bem-estar geral. Variações na duração do ciclo podem ocorrer por vários motivos, incluindo mudanças no estresse, viagens, dieta e exercícios, doenças ou outros fatores externos (3-5).
Nossa pesquisa contribui para essa compreensão crescente, sugerindo que a qualidade do ar que respiramos, especificamente a exposição prolongada à poluição do ar, pode influenciar os padrões do ciclo menstrual.
Este estudo é um dos primeiros a usar dados do ciclo monitorados em tempo real por um aplicativo como o Clue para investigar como os fatores ambientais podem afetar a menstruação em grande escala. Combinando essas informações com estimativas de poluição baseadas em satélite, conseguimos examinar os padrões do ciclo menstrual de milhares de pessoas em diversos contextos geográficos e ambientais. Essa abordagem permitiu um nível de escala e especificidade que não era possível antes na pesquisa sobre saúde menstrual.
Os dados gerados pelas pessoas que usam o Clue ajudaram os pesquisadores a descobrir padrões que poderiam ter passado despercebidos. Isso mostra como monitorar o seu ciclo pode ajudar tanto a entender melhor o seu corpo quanto a contribuir para o progresso científico.
O que você pode fazer para proteger a sua saúde (e o seu ciclo)
Embora nem sempre possamos controlar o ar que respiramos, existem algumas medidas que você pode tomar para reduzir a sua exposição e entender melhor como o seu corpo reage:
Verifique a qualidade do ar local: muitas cidades fornecem dados em tempo real online ou por meio de aplicativos. Em dias de alta poluição, considere limitar as atividades ao ar livre para reduzir a exposição (1).
Monitore o seu ciclo: monitorar com aplicativos como o Clue pode ajudar você a entender o que é normal para o seu corpo, para que possa detectar mudanças mais cedo.
Converse com seu médico: se você notar mudanças no seu ciclo ou estiver sentindo sintomas que afetam sua qualidade de vida, monitorar os dados pode ajudar a orientar essas conversas.
Isso é só o começo
Essa pesquisa faz parte de uma conversa maior sobre como os fatores ambientais afetam nossa saúde e por que a saúde menstrual e reprodutiva precisa fazer parte dessa conversa. E com a crise climática continuando, entender como o meio ambiente afeta nosso corpo é mais urgente do que nunca.
Ainda há muito trabalho a ser feito para entender mais detalhadamente como a poluição do ar pode afetar o ciclo menstrual. Esperamos que nosso estudo leve a mais pesquisas sobre os mecanismos biológicos que ligam a poluição ao funcionamento do ciclo menstrual. Mas este estudo é um passo à frente em mostrar que a saúde menstrual não é apenas pessoal—ela também é ambiental.
A todas as pessoas que usam o Clue e contribuíram com seus dados: nosso muito obrigado. Este trabalho não teria sido possível sem vocês.